O grande mestre ainda não foi compreendido pela grande maioria das pessoas. Esta é uma constatação pessoal. O caos externo, social, ambiental, geopolítico… do momento, que influencia e condiciona o caos interno, individual, mental, psicológico, emocional…, permanece assolando a humanidade após um quarto de século transcorrido, falando por si.
“Aceitar Jesus” é fácil; difícil é compreendê-lo e vivenciar seus ensinamentos eternizados, voltados à libertação (de nosso mundo subjetivo de ilusão mental).
Vejamos essa mensagem trazida no dito 15 do Evangelho Gnóstico de Tomé: “Jesus disse: “Quando virem alguém que não nasceu de mulher, prostrem-se e adorem-no. Ele é o Pai de vocês.”
O que Jesus quis dizer com essa fala misteriosa ou velada? O que pode significar a expressão “nascido de mulher”? De antemão, descarto o sentido literal. Numa visão mais abstrata e holística, faz sentido entendê-la como tudo o que se refere ao mundo da forma, da biologia e, sobretudo, do condicionamento ou da influência externa.
Possivelmente, para o mestre Krishnamurti, o ser humano “nascido de mulher” significasse o ser humano “nascido do passado”, moldado por sua programação inata e – pior – por aquela construída pelos relacionamentos ao longo da vida, a começar dentro de casa. Alguma dúvida de que a criancinha absorve tudo o que papai, mamãe, vovô, vovó… dizem (pode vs não pode; bom vs ruim; justo vs injusto; cristão vs ateu; perigoso…)? Soma-se a essa programação o que é assimilado nas escolas, faculdades e no âmbito sóciocultural em geral.
Como constatava Krishnamurti, nós somos feitos de memórias, de tradições, de medos herdados, de nacionalismos, de crenças. Somos o resultado do tempo. O “eu”, o ego, é essa estrutura acumulada, que, para nós, infelizmente, se confunde com quem somos. Não por acaso, tudo que nos causa repulsa, ira ou emoção negativa qualquer é culpa dos outros ou das circunstâncias. Tudo vira pessoal, motivo para reação e para racionalizarmos o comportamento automático e vicioso. Nossa vida se torna extremamente previsível: não passa de repetição de padrões de conduta.
Quando Jesus diz para buscar “aquele que não nasceu de mulher”, ele não está falando de uma entidade mágica flutuando no céu. Ele está apontando para aquilo que não é produto do pensamento; aquilo que ultrapassa as paredes da mente condicionada; que vai além de nosso conhecimento acumulado e ao qual estamos aferrados.
O “não nascido de mulher” seria a inteligência que não foi fabricada pela mente humana delimitada, egocêntrica. É a inteligência que surge no silêncio entre dois pensamentos. É a percepção pura, o próprio silêncio, sem a interferência do observador (o “eu” que julga).
Na linha de Krishnamurti, “prostrar-se” e “adorar” não teria a ver com adesão a rituais ou submissão por temor reverencial, aos quais era acesso. Penso que “prostrar-se” e “adorar” implica “entrega”, “desapego”, “fé no desconhecido”. Prostrar-se aqui seria o ato de o “eu” (o ego barulhento) silenciar completamente diante da imensidão do desconhecido (a Vida como ela é). Quando o “eu” se cala — sem resistir, sem julgar, sem querer mudar o fato — ocorre essa “adoração”. Não é uma submissão servil; é uma comunhão total. “Prostrar-se” é não brigar com os fatos. Quando você para de brigar com “o que é”, a energia que você desperdiçava no conflito se torna a própria inteligência (o Pai).
Jesus veio falar para todos, inclusive, aos jovens. Daí, vale tentar simplificar a ideia central.
Explicando a um jovem adolescente: o robô e a eletricidade
Se um jovem de 16 anos, cheio de vida e dúvidas, perguntasse sobre isso, como explicar a ele? Metáforas podem ajudar.
”Imagine que você comprou um robô ultra-avançado. Ele fala, anda, faz contas e até conta piadas. Ele foi montado numa fábrica (“nasceu de mulher”; foi criado). Tudo o que ele diz vem da programação que colocaram nele.
Mas o que faz o robô funcionar? É a eletricidade, a energia pura que corre nos fios. Essa energia não foi ‘montada’. Ela não tem marca, não tem opinião, não tem dono.
Jesus estava dizendo algo parecido com isso.
Quem ‘nasceu de mulher’, é a nossa ‘programação’. É o nosso nome, o que aprendemos na escola, o que nossos pais disseram que é certo ou errado, as curtidas no Instagram, a nossa vontade de ser popular. Isso é o ‘robô’. A maioria de nós passa a vida adorando o robô, achando que somos apenas essa programação.
Quem ‘não nasceu de mulher’, é a Vida que está dentro e fora de você, antes da programação. É aquela sensação pura de existir quando você olha um pôr-do-sol e, por um segundo, esquece seu nome e seus problemas. É a Inteligência da natureza.
’Prostrar-se’ não significa ficar de joelhos na igreja. Significa ter a humildade de perceber que a sua programação (seus julgamentos, suas teimosias, seus preconceitos) é pequena perto dessa Vida maior.
Então, ‘não resistir ao mal’ ou ‘adorar o Pai’ é simplesmente isto: desligue o modo automático do robô. Pare de julgar tudo como ‘chato’ ou ‘legal’. Quando você para de rotular as coisas, você percebe uma inteligência muito maior guiando tudo. Respeite a realidade mais do que você respeita as suas opiniões sobre ela.”
Essa explicação faz sentido para você? Ela conecta a ideia de “julgamento” (o software do ego) com a “adoração” (a conexão direta com a fonte), mantendo a simplicidade que você busca.





