Que, em 2018, os “crimes de docência” sejam combatidos e erradicados, em respeito aos alunos!

Renato R Gomes Administrador

Fato um. “Professor” do curso de “direito” de uma famosa universidade particular perguntou,

na prova de processo civil, se era cabível a fungibilidade entre os recursos especial e extraordinário. A aluna, dedicada ao aprendizado, interessada em desenvolver seu raciocínio jurídico e que havia estudado o tema no livro de certo jurista, identificou-se com a sua argumentação, no sentido da impossibilidade jurídica de o recurso especial ser recebido como extraordinário. Foi a resposta dada na prova. Prova corrigida, questão “zerada”.

Por quê? O “professor” discordou; defendia o “entendimento” contrário. Indagado racional e objetivamente pela aluna sobre o porquê do zero, se ela se respaldara em argumentação coerente e pautada na opinião de especialista com livro publicado, não apresentou razões sérias para fundamentar a nota zero. Usou apenas do arbítrio: “Recorra da nota”. E manteve o zero ao analisar o recurso.

Fato dois. ”Professor” com posturas constantemente intimidantes, ameaçadoras, depreciativas e desmotivadoras. Causar terror na turma e reprovar alunos constitui o seu prazer. Denota, eufemisticamente, espécie de sadismo docente. Realisticamente, o vício do próprio caráter. Ou, ainda, metaforicamente, o ensino jurídico doente, como há tempos já havia declarado o saudosíssimo Professor J.J. Calmon de Passos. “Comum” dizer em alto e bom tom às suas vítimas, durante as “aulas”, que não faz questão de ser amigo de alunos; que a maioria será fracassada. Suas provas são cheias de questões-pegadinha, sejam ou não de múltipla-escolha (como se múltipla-escolha fosse questão digna de curso decente de Direito!). Alunos, naturalmente, preocupados, angustiados, ansiosos pelo encerramento do martírio. Muitos, inclusive, abandonando a disciplina, para cursá-la no semestre seguinte, com um outro professor (sem “aspas”, espera-se).

Pausa para uma observação trágica: o “professor” mencionado nos fatos um e dois é o mesmo! Incrível, não? Negação completa do que seja um legítimo Professor-líder, vocacionado.

Fato três. Aluna, empolgada com a preparação do projeto de monografia de conclusão do curso de “direito”, foi comentar com o seu “professor orientador” o que pretendia defender no trabalho. Recebeu como resposta aproximadamente o seguinte: “Você não tem condições de inovar nada. É mera aluna; não tem conhecimento. O trabalho deve ser descritivo, baseado no que já está escrito e existe no mercado. Proibido também usar livros eletrônicos (e-books) e textos publicados em internet como fonte bibliográfica.” Depois do banho de água fria e de ter sido qualificada implicitamente como uma estúpida e irracional, incapaz de identificar o que seria ou não um artigo ou e-book de bom conteúdo, a estudante perdeu a motivação para estudar e desenvolver sua argumentação jurídica; ateve-se apenas em copiar a doutrina e em observar os requisitos formais da ABNT. Afinal, no ensino jurídico-formal falido, o importante é passar na disciplina. Concorda, prezado leitor?

Fato quatro. Prova de direitos reais; propriedade, especificamente. Uma das questões dizia respeito à transferência de imóvel, mediante contrato de compra e venda. Preço pago pelo comprador; ainda não havia sido registrado o contrato, nem lavrada a escritura em cartório. O professor queria saber quem era o titular do imóvel. O aluno desenvolveu o problema e, ao final, disse que, juridicamente, o imóvel ainda pertencia ao vendedor, porque a transmissão ao comprador só ocorreria com o registro e a escritura. Encerrou, dizendo que o comprador tinha uma “quase propriedade”, usando a palavra “quase” no sentido comum de iminente. Prova corrigida, meio ponto (0,5) perdido na questão. Questionando a “professora” – uma juíza de direito – sobre o que estaria errado, recebeu como resposta sucinta: “Não existe isso de ‘quase’ propriedade”. Verdade; pelo que sabia, nenhum jurista escrevera isto. Com a resposta da “professora”, começou a perceber que jurista brasileiro tende a ser onisciente. Então, decepcionado, calou-se e aceitou a nota.

O que tem em comum nos quatro fatos? Os quatro casos foram reais. Os três primeiros, acontecidos neste ano de 2017. O último, em 1999. Os primeiros foram vivenciados por duas excelentes alunas, acima da média geral. Como sei disso? Foram minhas alunas anteriormente; são minhas amigas e estagiárias atualmente. Fácil deduzir: todos os três episódios ocorreram na mesma faculdade. Mas, infelizmente, tudo é visto como “normal” pela coordenação do curso de “direito”, que se omite eloquente e covardemente, em benefício do indecente “professor” e, obviamente, em prejuízo psicológico e financeiro dos maltratados alunos.  O que posso dizer a respeito?

Quanto ao “professor” dos fatos um e dois, daria inicialmente duas recomendações a ele: peça demissão e procure urgentemente um tratamento psiquiátrico, associado a uma terapia cognitivo-comportamental. E, à coordenação, uma recomendação: tome coragem e demita o meliante docente.

Demissão, por ser um legítimo praticante continuado de crime hediondo de docência. Não há razão alguma para a universidade assegurar o emprego de um professor putativo, que não apenas desconcerta os estudantes, mas, também, abala a reputação do curso de “direito”, devido à propaganda negativa feita naturalmente pelos alunos psicologicamente afetados. E demissão, sobretudo, porque, por sua nítida falta de autocontrole psicológico e presumida visão egoística e apequenada do que seja a vida, está, com o seu péssimo comportamento, afetando a autoestima, a autoconfiança e automotivação de jovens potencialmente promissores, dispostos a estudar e a aprender Direito, e que nada têm a ver com o seu desequilíbrio mental, emocional ou a sua falha de caráter. Como demonstrado por Adam Grant, personalidade típica de tomador, sujeito que só olha exclusivamente para si, sendo irrelevante se, para beneficiar-se (com o salário ou prestígio de professor universitário), tenha que explorar ou magoar pessoas com quem se relaciona. Ajudar pessoas ou agregar-lhes valor, definitivamente, está fora de seu propósito. (Adam Grant. Dar e Receber. Uma abordagem revolucionária sobre sucesso, generosidade e influência. Rio de Janeiro: Sextante, 2014)

Tratamento psiquiátrico e cognitivo-comportamental, porque presumivelmente o seu modo de agir moral e socialmente reprovável no âmbito do ensino é provavelmente decorrente de vivências passadas, que foram internalizadas no subconsciente. Esse tal “professor” projeta as próprias deficiências psíquicas em pessoas, as quais, na verdade, deveria fomentar a reflexão, motivar a alcançar os seus objetivos profissionais, encorajar a pensar e a desenvolver ideias originais.

Os “professores” dos fatos três e quatro, considero-os típicos domesticados pelo sistema; meros repetidores (como diagnosticado há anos pelo cientista e psiquiatra Augusto Cury) do que aprenderam e enraizaram acriticamente ao longo dos anos de doutrinação jurídica. Também cometeram crime de docência. Mas creio, supostamente, que ambos possam ser absolvidos pela ausência de potencial conhecimento da ilicitude, espécie de exclusão da culpabilidade. Ou seja, estavam inconscientes do males que faziam aos alunos, desestimulando-os a raciocinar, a desenvolver argumentações coerentes, a tornarem-se Pensadores do Direito. Eram (e provavelmente continuam) incapazes de percebê-los, tamanha a intensidade do amestramento jurídico por que passaram!

Você, leitor, pode(ria) me indagar: “Renato, você não está exagerando nas críticas? Suas estagiárias não podem ter exagerado ou feito maus juízos de valor das situações um, dois e três?” Duvido; absolutamente! Porque falo de relatos de pessoas amigas. E, amizade, para mim, envolve integridade de caráter, lealdade, honestidade, sinceridade, fidelidade à própria palavra. Você, leitor, que possui amigos de verdade, certamente entende o que são esses valores e o que digo agora. Além disso, minha experiência pessoal, na graduação, intuitivamente, não me deixa enganar: ao ter emprestado os meus ouvidos para escutar os desabafos de minhas amigas e podê-las orientar, instintivamente surgiu um sentimento de irritação, misturado com desprezo, em relação ao “professor” dos fatos um e dois, e outro similar, mas menos intenso, voltado ao do fato três. E por quê? Exatamente porque vivenciei episódios semelhantes e desprezíveis durante minha graduação, há 20 anos. Meu sistema intuitivo (sistema 1, de Daniel Kahneman) foi acionado instantaneamente, fazendo-me relembrar do fato quatro, cujo aluno era eu, em carne e osso.

Hoje, sou grato por terem passado no meu caminho jurídico “professores” domesticados e inconscientes da destruição do ensino jurídico que promoviam (e, por presunção, assim continuam). Graças a minha característica de ser extremamente racional, fui salvo por eles dos efeitos nefastos da imposição dogmática cega, cujo resultado prático é o “direito esquizofrênico” e a sua pífia efetividade que temos hoje. Despertei para a realidade. Felizmente, passei a analisar o Direito com mais atenção e, principalmente, a desconfiar do que falavam e escreviam os nossos diversos “especialistas”, enquanto não encontrasse embasamento coerente no que sustentavam. É o que faço até então. É o que todos deveriam fazer. Não porque eu estou certo no meu método de estudo, nas minhas abordagens ou visões jurídicas, mas, sim, porque ninguém é dono da verdade ou tem a primazia do conhecimento!

Muito menos no Brasil, Estado onde há excesso de leis e, contraditoriamente, onde o que mais transparece é um vazio normativo, de tanto que as leis são seletiva e ideologicamente manipuladas, descumpridas ou invalidadas, aleatória e casuisticamente, de acordo com o interesse da vez! Estado que se autoproclama utópica e nominalmente “Democrático e de Direito” (CF,1.º), mas que não passa de Cleptocrático e de Arbítrio Judicial, motivado por preferências morais e ideológicas do julgador!  Estado onde há juristas que escrevem sobre hermenêutica, interpretação e teoria da decisão, cuja humildade não aparenta estar dentre suas virtudes, mas que, paradoxalmente, não conseguem construir e propor, via de regra, argumentações sólidas, coerentes e úteis para a melhoria da efetividade e credibilidade do Direito. Estado onde os valores estão institucionalmente subvertidos; onde a legítima defesa é criminalizada, não obstante seja um direito do cidadão previsto em lei (CP,23); onde policiais que combatem a desordem são transformados em vilões e, delinquentes, generalizadamente vitimizados, como se agir ilicitamente fosse comportamento constitucionalmente permitido (5.º,II). Estado onde a autoridade doutrinária e acadêmica é conquistada pelo “mérito” de seguir e adequar-se ao sistema formal e castrador de Pensadores aqui vigente, mas onde a produção intelectual – pouco original e muitas das vezes puramente importadora de teses estrangeiras, sequer adaptadas ao contexto brasileiro – não está à altura do pedestal em que muitos se colocam pela arrogância e vaidade.

Por outro lado, como tudo na vida, nada permanece eternamente em frangalhos. Em algum momento, haverá o saneamento político e o Estado será devidamente reestruturado. A partir de então, o sistema educacional, específica e inevitavelmente, será aperfeiçoado e modificado, em função da evolução tecnológica crescente e das novas demandas sociais prementes.

Aos estudantes de “direito” que realmente desejam estudar e aprender Direito, mas que sofrem com os efeitos da prática reiterada de crimes de docência, de modo pragmático, deixo-lhes algumas sugestões para 2018.

i) O seu sucesso independe do “professor”. Ignore-o; não perca seu tempo dialogando com “surdo”; vai descarregar a sua energia, fazê-lo sentir-se mal, se você não tiver uma suficiente e necessária inteligência emocional e, sobretudo, uma visão espiritualizada da vida. Aproxime-se de Professores (“P” maiúsculo) quando identificá-los, mesmo que não tenha tido a sorte de ter sido aluno deles. Aposto que terão satisfação em orientá-lo ou ajudá-lo com algum bom conselho.

ii) Espelhe-se em profissionais que admira; tenha-os como modelo. Veja o que leem, a bibliografia que utilizam, o que recomendam. Apesar de criticar de modo geral a fragilidade da doutrina nacional, jamais deixarei de reconhecer os excelentes juristas que há no Brasil. Como identificá-los? Pela leitura, você irá descobri-los. Mas um alerta: excelência não se confunde com notoriedade.

Dos que me chegam à mente agora, gosto bastante dos Professores (sempre com “P” maiúsculo) Humberto Ávila (de quem fui aluno) e Dimitri Dimoulis; João Maurício Adeodato e Juliano Maranhão; Paulo de Barros Carvalho, Ricardo Lobo Torres (com quem também estudei), Souto Maior Borges. Em homenagem póstuma, não posso deixar de mencionar os excelentes processualistas, Professores  J.J. Calmon de Passos, Ovídio Baptista e Barbosa MoreiraHumberto Ávila, particularmente, inspirou-me pela originalidade de suas teses e, mais, pela solidez e coerência de sua argumentação jurídica. Ricardo Lobo Torres, pelo vasto conhecimento e pelas impressionantes lucidez e consistência manifestadas em seus argumentos em defesa há anos de teses liberais, sem ter-se deixado contaminar por uma academia permeada de ensinamentos com vieses socialistas, utópicos, tendenciosos.

 iii) Leia e estude sempre. Faça disso um hábito prazeroso. Quanto mais o seu bom conhecimento é ampliado e solidificado, mais intenso será o prazer pela leitura. Leia e estude para ser o melhor profissional do Direito que puder. Terá, portanto, que estudar Direito, e, não, o “direito” ensinado na maioria das faculdades, ou o exigido por bancas examinadoras em concursos públicos. Leia biografias; lições de vida são transmitidas. Podemos aprender com erros alheios e copiar ações que deram certo e sejam pertinentes aos nossos objetivos. Otimizamos tempo.

     Leia sobre investimentos e estude os mais adequados ao seu perfil. Adquira educação e inteligência financeiras. Construa a sua liberdade. Torne-se independente do paternalismo previdenciário do Estado. Nós, eu, você e qualquer brasileiro, não merecemos ser reféns de políticas de (des)governos, de reformas de previdência ou qualquer medida legislativa, e tampouco somos obrigados a viver angustiados e a nos tornarmos seres psicologicamente adoecidos, o que, para muitos, acaba sendo fato inevitável, tão logo sintam-se atingidos por elas.

Estude para autodesenvolver-se e autoconhecer-se como ser humano, reconhecer sua personalidade, identificar e viver em função de seus valores e critérios pessoais que os definem, bem como para aprender a se relacionar com as pessoas e a comunicar-se com transparência e integridade. Em especial, aprenda a ser fiel à sua palavra; a não levar nada para o lado pessoal; a não tirar conclusões ou prejulgar; a dar sempre o melhor de si; a ser grato pelo que tem hoje e a parar de reclamar, de se fazer de vítima ou de culpar os outros; a ser cético e desapegado, mas humilde, estando sempre disposto a escutar e, se for o caso, a reformular ou a alterar pontos de vista, em respeito à própria honestidade intelectual.

Encerro: que o ano de 2018 seja para você, leitor, repleto de prosperidade! E especificamente para você, estudante, que realmente almeja a realização profissional por meio do Direito, espero que, de algum modo, esse texto possa tê-lo ajudado a refletir sobre acontecimentos experimentados, e sirva de estímulo à colocação em prática, daqui em diante, de conclusões a que tenha chegado, voltadas a seu benefício merecido e a dos que lhe são caros.

     “O que importa não é o que fazemos de vez em quando, mas sim nossas ações contínuas. E quem é a mãe de todas as ações? A resposta: as decisões. São elas que moldam nosso destino. Mais do que tudo, acredito que as decisões – e não as condições de vida – determinam nosso destino.” (Anthony Robbins. Passos de Gigante. 3.ªed. Rio de Janeiro: Viva Livros, 2017. p.12)