Fato um. Ministério Público do Trabalho (MPT) notifica a Rede Globo,
baseando-se na Constituição (art.3.º e 5.º) e no Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010, art.43 e 44), para que inclua mais atores negros em sua próxima novela (“Segundo Sol”). Caso contrário, a emissora responderá judicialmente, por discriminação e consequente “violação” do dever de promover a igualdade, dos direitos individuais indisponíveis e abstrações jurídicas pomposas similares, retirados criativamente (ou fantasiosamente?) do texto da Constituição e do referido estatuto.
Mas, de modo incrivelmente hipócrita, “se esquece” de que possui apenas 1,16% (9 de 776) de negros como ocupantes de seus cargos. Não faz o dever de casa e fica apontando “falhas” nos outros? Pensando com meus botões: crianças até os 7 anos têm comportamentos semelhantes?
Fato dois. Deputado federal do PSOL/RJ, Glauber Braga, apresentou Projeto de Lei 10.142, pelo qual deseja assegurar aos presos, que “trabalham” na cadeia, salário mínimo, décimo-terceiro, férias, e demais direitos previstos na CLT.
Por outro lado, não tem a menor vergonha de demonstrar a sua cegueira ideológica, ignorando a realidade crua e nua. Menciono apenas a falta de reajustes anuais dos proventos de trabalhadores aposentados honestamente pelo INSS, que recebem acima do salário mínimo, após anos de serviços prestados, mas que vêm sobrevivendo, “virando-se nos 30”, sabe-se lá como. Dívida pública gigantesca e parcos investimentos pró-sociedade, destinados à infraestrutura e a melhorias dos serviços públicos essenciais risíveis, feitos com o dinheiro de impostos que pagamos? “Tô nem aí!”, deve pensar sua excelência, o “nobre” deputado!
Fato três. Caminhoneiros em greve, devido ao aumento rotineiro do preço dos combustíveis (diesel, especialmente), interditam estradas e provocam desabastecimentos de proporções imprevisíveis e imponderáveis, de produtos essenciais à subsistência individual e empresarial, gerando prejuízos sociais, econômicos e fiscais incalculáveis.
Não se nega a legitimidade constitucional da greve, quando voltada à busca de melhores condições ou à redução dos custos de trabalho, a serem garantidas pelo (Des)governo. Mas, neste caso específico, a legitimidade da greve para forçar a redução do preço do diesel pelo (Des)governo não deveria estar condicionada, pelo menos, ao requisito de não ser lesiva aos que nada têm a ver com o valor abusivo do combustível hoje? Em outras palavras: juridicamente, pode a greve tornar-se um obstáculo intransponível na vida dos cidadãos comuns, todos igualmente reféns dos inqualificáveis serviços prestados por nossa Cleptocracia, que ora desagrada aos senhores grevistas, por endossar a política de ajustes de preços da gasolina e do diesel, implementada pela PETROBRAS pós-petrolão, visando ao resgate de sua credibilidade do passado?
Apresentados os três fatídicos episódios ocorridos neste inesquecível maio de 2018, pergunto: o que há em comum entre eles? Objetivamente, destaco os (des)valores da irresponsabilidade, da covardia e do egocentrismo.
Do egocentrismo à irresponsabilidade e à covardia. Sem entrar em discussões sobre “o que se entende por trabalho artístico”, se “a promoção da igualdade racial deve ser avaliada caso a caso, de acordo com cada tipo de arte”, ou se “o MPT pode defender a igualdade racial no trabalho, mesmo quando inexistem lesados” (algum ator negro representou seu inconformismo ao MPT?), o que leva um procurador do trabalho a deduzir, do fato de “haver poucos atores negros numa novela”, pela “existência de discriminação contra atores negros”, promovida pela Rede Globo?
Com muito esforço, cheguei a uma conclusão: juízo de valor distorcido, motivado pela cegueira ideológica e exteriorizado pela notificação da Rede Globo, ridiculamente fundamentada e, ainda, apenas realizada – ouso dizer – pela certeza da impunidade legal do procurador (ir)responsável, por ato que cometa arbitrariamente, no suposto exercício de suas atribuições. Se o agente público sabe que nada vai legalmente lhe acontecer, basta-lhe uma pitada de vaidade e egocentrismo para fazer o que lhe vier à mente, por mais que o odor de sua imaginação justiceira não agrade à maioria dos espectadores! Azar de quem for o alvo (Rede Globo). Nome disso? Abuso de poder, traduzido por covardia institucional. Procurador do trabalho, por ócio no trabalho, tentando inviabilizar o trabalho (artístico legítimo)! Inacreditável!
O que dizer do “brilhantismo” de sua excelência, o deputado? Igualmente: ideologia cega, atiçada pela falta do que fazer politicamente para, egocentricamente, marcar posição junto – presumo – a seus potenciais eleitores, familiares dos presidiários. Irresponsabilidade política, face ao completo desprezo pelos previsíveis efeitos que a aprovação de uma medida legislativa desse quilate provocará na esfera fiscal (de onde vem a grana para bancá-la?) e social (“Entre aceitar o desemprego e tentar explodir um caixa 24h… No fim das contas, dando errado, garanto meus “direitos” do trabalho na prisão e o auxílio-reclusão para minha família, né?”). E covardia moral, equivalente a um soco no estômago dos verdadeiros trabalhadores, que ralam diariamente para sobreviverem, em troca de um piso salarial sarcástico; ou a um mata-leão nos aposentados do Estado do Rio de Janeiro, que sequer em dia vem recebendo suas pensões!
E quanto aos valentes caminhoneiros? Legítima a motivação jurídica para a greve, visando ao aperfeiçoamento de suas condições de trabalho e reduções de custos; inaceitável o exercício da greve sem freios legais, como espécie de chantagem, onde, ao final, quem paga a conta é a população; especificamente, o cidadão contribuinte. Greve é direito; o abuso, pela lesão a direitos de terceiros, é não-direito, que gera responsabilidades. Mas responder como, se vivemos num país onde grassa a impunidade legal, chancelada por parcela considerável de integrantes do Poder Judiciário, e a cultura política do fisiologismo? Recaímos novamente na irresponsabilidade e na covardia: “As necessidades básicas só voltarão a ser atendidas, e o país só voltará à ‘normalidade’ quando nós – caminhoneiros – quisermos desobstruir as estradas!” Não tem jeito: só recorrendo à força estatal efetiva, o que, por si, desmonta qualquer discurso ideológico contrário a punições legais e rigorosas de baderneiros e criminosos! Entre mim e você, leitor: isso é coisa de país sério? Vivemos realmente num Estado de Direito? Duvido há anos.
“O gênio e o louco num ponto se assemelham: ambos vivem em um mundo diferente daquele em que vivem os outros mortais.” (Arthur Schopenhauer)