Coletiva de Moro, sua demissão do governo e resposta do presidente da República. Minha opinião.

Renato R Gomes Administrador

Sérgio Moro reuniu coletiva de imprensa e comunicou sua saída do Ministério da Justiça e da Segurança Pública.

De impactante, disse que saía, porque Bolsonaro não lhe apresentou argumentos técnicos que justificassem as exonerações do diretor-geral da Polícia Federal e de superintendentes regionais de sua confiança. Serena e polidamente como de praxe, afirmou que Bolsonaro queria ter controle político da Polícia Federal e ter acesso a relatórios de operações que estivessem em andamento. Disse que o ex-diretor-geral, Maurício Valeixo, não pedira demissão, e que a exoneração publicada em diário oficial estava como o nome dele – Moro -, sem que a tivesse assinado. A promessa de carta branca que Bolsonaro lhe havia dado, na verdade, fora descumprida. Declarações que soaram honestas e sinceras; além, obviamente, de politicamente bombásticas.

Em seu pronunciamento-resposta, o presidente da República não negou o seu interesse em ter acesso direto ao diretor-geral da Polícia Federal, tal como tem e recebe informações de outros setores de inteligência, vinculados ao Poder Executivo. Afirmou enfaticamente seu compromisso com a plena autonomia da Polícia Federal e jamais ter interferido em qualquer investigação que fosse. Reclamou de pouco caso demonstrado pelo ex-ministro para elucidar a tentativa de seu homicídio, as razões do falso testemunho do porteiro que buscou incriminá-lo no caso Marielle, bem como acusações relacionando a ligação de sua família ao assassino da ex-vereadora carioca.

Disse que o ministro vinha se opondo a pautas caras a seu governo – promessas de campanha -, como a facilitação do acesso a armas. Frisou que deu, sim, carta branca a todos os ministros, mas sem que tivesse aberto mão de seu poder de vetar nomes, quando achasse conveniente e oportuno. Ressaltou que sempre esteve e está acessível a todos os ministros, disposto a conversar, escutar propostas ou avaliar nomes sugeridos. Mas não admitiu que apenas nomes indicados por Moro fossem tidos como os únicos competentes para os cargos de diretor-geral e superintendentes da Polícia Federal. Não gostou de Moro não o ter procurado para conversar antes de falar na coletiva de imprensa, como se ele não estivesse disponível para chegarem a um bom termo. Por fim, disse que Moro lhe propusera que Maurício Valeixo ficasse até 11/2020, quando então Celso de Mello se aposentaria no STF e ele poderia ser indicado para a vaga aberta na suprema corte. Fato este que Moro negou veementemente, logo após a fala do presidente.

Nesse meio tempo, o PGR, Augusto Aras, pede ao STF abertura de inquérito para investigar crimes cometidos por Bolsonaro, com base meramente nas palavras de Moro.

Minha análise. Aspecto moral. Senti honestidade intelectual e verdade na fala de Sérgio Moro. Tanto que Bolsonaro não o desmentiu, ao dizer que tinha o interesse de saber o que ocorria no âmbito da Polícia Federal. Por outro lado, também intuí sinceridade e verdade na fala do presidente da República, apesar de este, de fato, não ter dito as razões técnicas pelas quais queria a exoneração de Valeixo do cargo de diretor-geral da Polícia Federal, pois foi muito claro: a razão foi eminentemente política, e a lei lhe permitia fazê-lo, por puro juízo político. Como se tratou de exposição de conversa absolutamente particular entre ambos, cada um deles tirou as suas próprias conclusões.

Contudo, uma atitude de Sérgio Moro específica não me agradou: ter pedido demissão durante coletiva à imprensa, sem ter tido a lealdade de procurar o presidente para uma conversa final e lhe ter entregue pessoalmente sua carta de demissão. Depois, sim, daria satisfação à imprensa, tal como o fez.  Se considerou Bolsonaro um homem que não honra a palavra dada, isto não poderia ser justificativa para que agisse com suposta deslealdade para com ele.

Se alguém não dá a mesma relevância que eu a determinado valor moral, não significa que tenho o direito de relativizar o que considero o certo, para, então, me autoconceder carta branca para exercer uma espécie de vingança sutil e implícita. Apostaria que, se Moro estivesse no lugar do Bolsonaro, não gostaria que este, se ministro da Justiça, tivesse agido com ele, tal como fizera neste inesquecível 24/04/2020.

Moro poderia alegar: “Mas eu jamais trairia a minha palavra!” Volto ao ponto: as pessoas são imperfeitas; um erro não justifica outro. A vaidade e o egocentrismo do ex-ministro, travestidos pelo rótulo de “zelo pela biografia moral” e “desapego louvável de cargos”, subliminarmente, falaram muito alto. A tentativa de chamuscar o presidente da República falou por si. Se o fez inconscientemente ou não, pouco importa. Intimamente, digo que faria diferente.

Aspecto jurídico. O Aras foi extremamente precipitado em pedir abertura de inquérito, baseando-se apenas nas palavras de Moro sobre a sua percepção de que o presidente queria ingerência política na atuação da Polícia Federal. Por quê? Não há um mínimo de indícios de atos do Bolsonaro (até agora, 24/04/2020) que justifiquem o seu enquadramento em sete tipos penais.

Nem o crime de falsidade ideológica, sob o argumento de Moro de não ter assinado a portaria de exoneração de Valeixo, e, apesar disso, o seu nome constar no documento, junto ao do presidente. Até porque a publicação do documento foi meramente proforma. E Moro, pela manhã, ainda estava ministro. Na prática, foi uma picuinha irrelevante, insuficiente para a formulação de uma acusação séria do presidente da República por crime de falsificação ideológica, como se a assinatura do Moro em si pudesse impedi-lo de exercer o poder de demitir o DGPF, que a lei lhe atribui, ainda no mesmo dia 24/04/2020. A propósito: o presidente teve mesmo a intenção de delinquir, tão somente para antecipar em algumas horas uma demissão que já estava certa? Em troca de quê? Data venia, acusação normativamente insustentável, por presumida e intuitiva ausência de dolo.

Aliás, o Augusto Aras está mostrando a que veio: para reforçar a ditadura da toga esquerdista suprema, levantando as bolas para os ministros cortarem, sempre confiantes em que o “direito” se presta a coagir e punir os reles mortais; nunca para pegá-los. Foi assim com o pedido indecente e antidemocrático de abertura de inquérito totalitário supremo, para investigar uma manifestação de liberdade de expressão legítima ocorrida em 19/04/2020, pela qual manifestantes ousaram pedir o fechamento do STF e congresso, dentre outras coisas. Como se STF e congresso, atualmente, fossem instituições democráticas verdadeiras e dignas de apreço e respeito; muito longe disso! Mas como a subversão da ordem jurídica tem sido supremamente escancarada, os pobres descamisados bolsonaristas, bois de piranha, são os literalmente caçados da vez, pois “incidiram” na lei de crimes contra a Segurança Nacional, segundo a “interpretação” da dobradinha Aras-Moraes.

Aspecto psicológico. Ambos, Moro e Bolsonaro, demonstram muita força psicológica. Moro tem uma inteligência emocional que impressiona. A sua capacidade de não ser reativo, ser ponderado, ter finesse com as palavras, ser um verdadeiro estrategista, o fez merecer o prestígio ético que adquiriu ao longo dos anos de magistratura e desses meses enquanto ministro. Bolsonaro, quando opta por refletir antes de explodir, tal como fez no discurso de hoje, também deixa transparecer o domínio que exerce sobre situações de pressão. Diria que, esse 24/04/2020, foi o dia em que consegui, pela primeira vez, enxergar no homem Jair Bolsonaro a postura de um legítimo líder de uma nação: consciente, reflexivo, mentalmente forte, racional, emocionalmente controlado, autêntico, verdadeiro. O fato de ter deixado de responder, no mérito, por que do afastamento de Maurício Valeixo, equivale à hipótese de um ministro do STF se declarar suspeito para atuar em algum processo, alegando “razões de foro íntimo”. De ilegal, absolutamente nada.

Aspecto espiritual. Moro aparenta ser uma pessoa bastante consciente de sua missão de vida. O fato de ter sido intransigente e deixado o governo, porque inadmitiu ruptura da palavra dada por parte do presidente da República, inquestionavelmente, demonstrou a fidelidade à sua própria consciência e à sua hierarquia pessoal de valores. Como ele bem destacou, sempre orienta a sua equipe a fazer o certo, sem se preocupar com as consequências. Esta conscientização ético-moral denota . O futuro ou os efeitos de nossas condutas não estão sob o nosso controle. Este, aliás, é o mais grave erro de sociopatas e psicopatas no poder: fazem de tudo para se darem bem, como se os resultados só dependessem de suas vontades, e os covid-19 ou cisnes negros da vida fossem impossíveis de ocorrer e acabar com suas “festas”.

Quanto a Bolsonaro, diria que o nítido desconhecimento do poder jurídico que possui como presidente da República, aliado à sua evidente falta de fé, são as duas causas preponderantes das dificuldades que vem encontrando no relacionamento com o congresso e, principalmente, com o supremo. Ignorância jurídica, porque ludibriada e cegamente internalizou mentiras doutrinárias que puseram o Poder Executivo em estado de subserviência perante o STF e o Congresso Nacional.

“O supremo tem a última palavra, sempre.”“Decisões do STF não se discute; se cumpre.”“O Brasil é democracia”. Dentre outras falácias semântica, jurídica ou empiricamente insustentáveis. Como se onze ministros representassem onze poderes moderadores; como se fossem humanamente infalíveis e jamais errassem; como se fossem absolutamente confiáveis e exemplares. Não à toa, o presidente da República vem acatando rupturas constitucionais escancaradas, engole e digere a seco usurpações de sua competência pela manipulação interpretativa da Constituição, permite que a Polícia Federal cumpra ordens supremamente ilícitas, omite-se em tomar medidas jurídico-constitucionais duras em defesa de suas prerrogativas, do regime democrático e do Estado de Direito, e, sem surpresas, vem deixando a população de bem angustiada.

Bolsonaro explicita em atitudes a sua falta de fé, pois faz escolhas políticas incompatíveis com a retidão esperada de quem se declara cristão. Não apenas por ter sancionado textos legais imorais, com a presumida intenção de não desagradar congressistas e, assim, conseguir, de boa-fé, aprovar as reformas de interesse para o país. Mas, também, na escolha de líderes do governo na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Por que não escolher um deputado como o Marcel Van Hattem, inteligentíssimo, íntegro, intelectualmente honesto, extremamente bem articulado com as palavras? Por que não convidar para líder do senado um senador como Lasier Martins, Alessandro Vieira ou Reguffe? Todos, parlamentares patriotas e com reputação moral inabalável. Fé não significa “acreditar em Deus”. significa, sim, fazer sempre o certo, com a motivação sempre correta (deixando jeitinhos ou segundas intenções de lado), despreocupando-se completamente com o que os outros vão pensar ou com reações negativas, chantagens e/ou sabotagens.

Razão simples, e de novo repisada: não é o ser humano que controla os efeitos dos próprios atos. Repito: o coronavírus demostrou isso, jogando integralmente no lixo os ganhos conquistados na economia, em 2019. A fé verdadeira está simbolizada no ditado popular “Quem com porcos anda, farelo come.” Ou, em linguagem bíblica, “A semeadura é livre, mas a colheita, obrigatória.” A incompreensão da fé está no fato de que não se aprende a portá-la pelo uso puro da razão. se adquire com a ampliação da consciência. Esta exige a compreensão de que a natureza abrange também o mundo metafísico, além do físico, material. Pressupõe que lembremos constantemente sermos mortais, e que estamos aqui por alguma razão primordial. Certamente, não é pela busca obstinada por dinheiro, poder, reconhecimento ou influência política.

demanda estudo adequado. Só tem verdadeira quem é capaz de tirar lições subliminares das próprias experiências de vida, aprendê-las e assimilá-las, de modo a ajustar atitudes ou corrigir hábitos. O grau de solidez da fé é proporcional ao desenvolvimento de nossa capacidade de compreender o porquê de nossas vivências e do consequente e natural aumento de nossa percepção intuitiva para fazer leituras precisas do momento que estamos presenciando. não é questão de crença ou descrença em algo; fé é questão de saber ou não saber que algo existe, opera quanticamente e, na ocasião ideal – que não necessariamente é a que desejamos -, se materializa no mundo dos fatos. Os resultados pretendidos, não nos cabem decidir quando ou como serão concretizados; cabe-nos, sim, entregá-los aos cuidados da – e confiarmos na – essência divina, aceitá-los quando aflorarem, compreendê-los, e agradecer pelo ocorrido e pela nova oportunidade de aprender e evoluir. Se Bolsonaro soubesse disso, apostaria que não teria tomado certas decisões políticas, pensando em “governabilidade”. E vida que segue.